O professor catedrático da Universidade de Barcelona que há 20 anos faz o monitoramento da ave Gongon (Pterodroma feae) em Cabo Verde defendeu a reintrodução desta espécie na ilha de Santa Luzia para evitar a sua extinção futura.
“Depois de todos estes estudos seria conveniente fazer um programa de reintrodução de Gongon na ilha de Santa Luzia, que agora não tem gato e poderia ser um lugar seguro para a reprodução desta espécie”, alertou Jacob González-Solís, observando que o Gongon sozinho não irá para Santa Luzia, o que implica a implementação de um programa de reintrodução com deslocação de filhotes de outras ilhas para este espaço.
“É um processo que estamos a considerar e pedir financiamento para fazer este trabalho e ter, pelo menos, um lugar onde o Gongon possa reproduzir com segurança”, declarou o especialista, assinalando que a população actual de Gongon é estimada em cerca de 2.500 casais.
Na ilha do Fogo calcula-se uma média de 200 a 300 casais, sendo que a população mais importante está na ilha de Santo Antão, sobretudo nas montanhas da parte norte, afirmou o professor, indicando que existe colónia de Gongon também em São Nicolau e Santiago.
Segundo o mesmo, dois “grandes projectos” financiados pela Fundação Mava ligados ao seguimento de aves marinhas e tartarugas na África Ocidental foram encerrados na sequência do fecho desta fundação, mas com resultado “muito importante e interessante”, permitindo um conhecimento das aves marinhas e das suas ameaças, mas também o empoderamento Organizações Não-governamentais (ONG) nacionais.
Este projecto permitiu conhecer melhor as aves marinhas de Cabo Verde, a sua população, onde estão a reproduzir e definir as áreas marinhas, monitorar as diferentes espécies de aves marinhas, referiu o professor, sublinhando que neste quadro está na fase de finalização do estudo demográfico do Gongon, depois de 15 anos de trabalho.
“Temos uma ideia de quais são os problemas mais importantes e se a população está em declínio ou não”, expôs o especialista, mostrando que o estudo aponta que esta espécie está em declínio e que se nada for feito daqui a umas décadas vai mesmo desaparecer.
A conclusão principal, segundo o mesmo, indica que as ameaças existem e ocorrem quando as aves estão a reproduzir, acrescentando que o resultado do estudo aponta que há um forte impacto de captura e predação pelos gatos.
“É urgente tratar este problema, ter o controlo da população de gatos que não tem donos e outros que têm muita liberdade de entrar e sair de casas”, disse, acrescentando que anualmente os gatos matam 4 por cento (%) da população adulta de Gongon e que face a isso os estudos demográficos demonstram que é “insustentável” e vai provocar a extinção do Gongon.
Outra “conclusão importante” deste estudo é a necessidade de se começar “urgentemente” a implementar um programa de controlo de população de gatos silvestres e tirá-los do campo, mas também que as pessoas tomam consciência desse problema e impeçam os gatos de sair de casa e reproduzir no campo.
Trata-se de uma fonte contínua de ameaça e com “impacto forte” na população de Gongon como de outras espécies endémicas de Cabo Verde, como lagartos e lagartixas.
Jacob González-Solís disse que as campanhas de castração de gatos efectuadas no quadro do Projecto Vitó são uma forma de minimizar a população de gatos, mas é insuficiente.
“Castrar é melhor que não fazer nada, mas mesmo assim há muitos gatos. Precisamos de um controlo dos gatos nas áreas de reprodução de Gongon, de campanhas específicas para capturar e retirar os gatos do campo “, preveniu.
Outra questão abordada na entrevista à Inforpress relaciona-se com o projecto de capturas acidentais das aves marinhas e tartarugas pelas embarcações de pescas industriais na África Ocidental, sendo que o resultado do projecto aponta para uma mortalidade bastante importante de tartarugas.
Segundo o mesmo, os dados indicam que as embarcações matam sete mil tartarugas/ano e isso tem um impacto muito forte sobre a demografia e a viabilidade das tartarugas marinhas, aludiu o professor.
A mesma fonte realçou que mesmo que algumas vezes apareça, que as tartarugas estão a reproduzir e a aumentar, mas analisando os estudos demográficos e pelos dados recolhidos pelas ONG de Cabo Verde, é notório que as tartarugas estão em declínio.
À semelhança do Gongon, continuou, vai extinguir-se se nada for feito para diminuir o número de tartarugas capturadas de forma acidental pelas embarcações de pescas industriais.
“Muitas pessoas pensam que se pode resolver o problema com protecção dos ninhos e muitas ONG estão a trabalhar nisso. Pode ajudar um pouco, mas não será suficiente. A única forma de parar o declínio de tartarugas em Cabo Verde é diminuir o número de mortes de tartarugas adultas reprodutoras na pesca industrial”, asseverou Jacob Gonzalez-Solis, indicando que as sete mil tartarugas que morrem todos os anos fazem parte da população que reproduz em Cabo Verde.
“Mesmo que parte desta mortalidade esteja a acontecer fora das ilhas de Cabo Verde o impacto é forte em Cabo Verde”, proclamou.
A saída da Fundação Mava, que nos últimos cinco/seis anos financiou vários projectos de conservação das espécies como aves marinhas e tartarugas, vai afectar na continuidade dos trabalhos e é de todo interesse dar continuidade aos trabalhos desenvolvidos e com resultados excelentes.
Este indicou que a Fundação Mava antes de encerrar ajudou as ONG de Cabo Verde a procurar outros financiadores para dar continuidade aos projectos e existem organizações não-governamentais internacionais que têm algum interesse em Cabo Verde como a Birdlife International e outras instituições da Suíça e Alemanha.
Jacob González-Solís estava em Cabo Verde para mais uma missão de acompanhamento do Gongon que está na época de reprodução que vai decorrer até início de Março com nascimento dos filhotes que devem deixar os ninhos em meados de Junho.
Inforpress